Barcelos é pioneira na referenciação de utentes com doença aguda para os cuidados de saúde primários
Esta é já uma realidade em Barcelos. Os utentes que cheguem às urgências do hospital com situação pouco urgente são reencaminhados para os centros de saúde que integram o projeto.
O primeiro desafio foi difícil de cumprir, mas com a colaboração dos serviços informáticos do Hospital Santa Maria Maior de Barcelos e da ARS Norte, tornou-se realidade: foi desenvolvido um sistema informático que permite a referenciação de utentes do hospital para consultas nos centros de saúde piloto da região, mediante a gestão de vagas disponibilizadas pelas seis unidades de cuidados de saúde primários que integraram a primeira fase do projeto: USF Barcel Saúde (C.S. São José), USF Cávado Saúde (Lama), USF Ligios (Lijó), USF Viatodos, USF Calécia (Macieira de Rates) e USF Martim. A segunda fase, a iniciar em breve, deverá integrar mais três unidades de saúde familiar da região.
Primeira dificuldade ultrapassada, munidos com uma aplicação informática “caseira” que funciona, passa-se ao segundo desafio. Explicar aos médicos, enfermeiros e auxiliares envolvidos porque é desejável reencaminhar os doentes pouco urgentes para os centros de saúde. Além da rapidez e comodidade, há uma vantagem a sublinhar: as urgências hospitalares ficam para quem realmente precisa de cuidados mais urgentes. É uma batalha que se vence com paciência, já que a mudança de procedimentos nem sempre é fácil de implementar. O caminho faz-se lentamente, enfrentando todas as resistências. Mas também este desafio foi ultrapassado em Barcelos.
Por fim, é necessário explicar ao utente que a causa da sua ida à urgência do hospital, onde recebeu uma pulseira verde ou azul na triagem, poderá ser tratada de forma célere e cómoda no seu centro de saúde. O hospital marca-lhe a consulta para o próprio dia ou, no máximo, para o dia seguinte. E, caso necessite de meios complementares de diagnóstico (MCDT), como análises ou exames, também é possível realizá-los no centro de saúde. Depois do devido esclarecimento, se o paciente consentir, é então iniciado o processo de referenciação para os cuidados de saúde primários.
Rui Guimarães, diretor clínico no Hospital Santa Maria Maior de Barcelos, classifica a união de esforços entre a unidade hospitalar e o ACES (Agrupamento de Centros de Saúde) Cávado III Barcelos / Esposende, como “um momento feliz”. O modelo de Gestão do Percurso do Utente com Doença Aguda/Agudização de Doença Crónica, em funcionamento desde do final de maio de 2018, prevê um atendimento específico para os doentes que chegam à urgência hospitalar a necessitar de cuidados de menor gravidade. Um entorse, uma dor de cabeça ou sintomas de gripe são exemplos dos sintomas apresentados por muitas das pessoas que vão até à urgência. Sendo casos menos graves, ao passar pela triagem, recebem uma pulseira verde ou azul e acabam por aguardar várias horas na sala de espera do serviço de urgência (SU).
O acordo implementado pelo Hospital de Barcelos com o ACES da região prevê que, após registar o doente, e depois da triagem, o utente é convidado a optar pelo encaminhamento para o centro de saúde. Esta escolha, que apenas é perguntada quando o envio para o SU não tenha sido feito via CODU e caso o doente não esteja em maca, é efetivada mediante aceitação do paciente. Nos casos em que o utente não aceita o reencaminhamento, o mesmo é submetido a um questionário para apurar as razões da recusa. As motivações detetadas são variadas, mas segundo Rui Guimarães, estas verificam-se sobretudo ao nível da Pediatria, já que os pais optam por dirigir-se ao hospital para que os filhos sejam atendidos por um médico especialista.
Centros de Saúde adaptaram-se para melhorar o acesso
“Não podemos convidar as pessoas a ir a um local melhor e não estarmos preparados” começa por explicar Sofia Leal, diretora executiva do agrupamento de centros de saúde. Para acolher o projeto, as unidades de saúde que dirige reorganizaram a oferta/resposta para conseguir melhor acessibilidade à Consulta Aberta em situação de Doença Aguda. Em complemento, aumentou-se a resolubilidade dos Cuidados de Saúde Primários em integração com o hospital de proximidade no âmbito da internalização de meios complementares de diagnóstico, investiu-se em literacia em saúde para utentes e profissionais e foi criado um manual de procedimentos, com redefinição do circuito do utente com doença aguda não urgente, através da criação de uma matriz de referenciação dos serviços de urgência para os cuidados de saúde primários (com vagas definidas pelos centros de saúde).
Até agora a joint venture entre os dois organismos tem tido sucesso. Em breve, a experiência será alargada a mais centros de saúde da região.
Integração de cuidados deve ser replicada em todo o país
“Cada caso é um caso” e desta forma, com as devidas adaptações, o projeto “Gestão do Percurso do Utente com Doença Aguda” de Barcelos, enquadrado no programa SNS+ Proximidade, permite integrar com sucesso os cuidados de saúde primários com os cuidados hospitalares, resultando numa fórmula de êxito no SNS.
As vantagens do modelo começam por conseguir dar uma resposta benéfica aos utentes que recorrem aos serviços de urgência hospitalar, convencidos que só ali vão encontrar os cuidados de que precisam, mas que descobrem que, pelo contrário, a sua situação de doença aguda pode ser resolvida pela equipa de saúde familiar. O atendimento “é ajustado à sua necessidade”.
Na solução encontrada em Barcelos, além da consulta, os utentes podem marcar análises clínicas, Raio-X ou Espirometria, sem necessidade de deslocações para marcar ou levantar resultados, uma vez que estes são integrados diretamente no processo clínico.
Joaquim Barbosa, presidente do Conselho de Administração do Hospital Santa Maria Maior defende a solução encontrada, não por eventuais vantagens financeiras, mas por ser uma melhoria concretizada em função do utente. “É nosso dever delinear estratégias para diminuir o número de urgências, com impacto na qualidade dos cuidados prestados aos doentes”, sublinha. Razão que leva à defesa da repetição do modelo de Barcelos a todo o país.
SNS+ Proximidade
O programa SNS+ Proximidade, desenvolvido durante a atual legislatura, prevê a integração de cuidados de saúde, através da boa gestão do percurso das pessoas nos cuidados de saúde, para os utentes com múltiplos problemas de saúde e de evolução prolongada.
O SNS+ Proximidade dá especial atenção a três tipos de cuidados:
- Cuidados para pessoas com múltiplos problemas de saúde, de evolução prolongada.
Mais de 1/3 da população portuguesa tem múltiplos problemas de saúde, sendo estas pessoas as utilizadoras mais frequentes dos serviços de saúde. Com o SNS+ Proximidade passam a beneficiar de um “plano individual de cuidados de saúde”, que facilitará a gestão dos seus percursos através dos serviços de saúde de que necessitam.
- Cuidados de saúde para a doença aguda, ou agudizações da “doença crónica”.
A utilização excessiva dos serviços de urgência hospitalar impede o bom funcionamento dos serviços e a qualidade dos cuidados prestados aos doentes. As seguintes medidas estão já em execução:
- Aumento da capacidade do SNS 24 de forma a garantir a orientação das pessoas com doença aguda;
• Dotar as consultas abertas (atendimento no próprio dia) das unidades de saúde familiar da capacidade para fazer análises e tratamentos em tempo útil, tornando desnecessárias as idas aos serviços de urgência hospitalar;
• Melhorar a comunicação entre as consultas abertas dos centros de saúde e os serviços de urgência, de forma a decidirem conjuntamente sobre os casos em apreciação.
- Cuidados de saúde em casa.
O SNS possui uma capacidade crescente para “cuidar em casa”. A hospitalização domiciliária é já uma realidade e os agrupamentos de centros de saúde (ACeS) passam a assegurar a necessária coordenação entre essas distintas modalidades de cuidados domiciliários, através da adoção do “plano individual de cuidados”.
