O hospital em casa
O Hospital Garcia de Orta (HGO) foi pioneiro na criação de uma unidade especificamente dedicada à hospitalização domiciliária. Num ano internou, em casa, mais de 200 doentes. “Cuidamos de si em sua casa” é o lema que dá vida a este projeto.
“Já me vai dar alta Sr. Doutor?” questiona Maria Pires, comodamente sentada no sofá de sua casa, enquanto a enfermeira Daniela Santos verifica a tensão e regista o valor no dossiê que disponibilizam com um guia explicativo e um contacto da equipa.
A pergunta é dirigida a João Correia, médico coordenador da Unidade de Hospitalização Domiciliária (UHD), do HGO. Desde 2015 que a UHD garante a prestação de cuidados de saúde de nível hospitalar, a doentes agudos com possibilidade de internamento no domicílio, como é o caso desta paciente de 84 anos.
Maria está internada devido a uma insuficiência cardíaca e, sob o olhar vigilante do marido, trocou o hospital pelo conforto do lar.
Por “ser tudo muito confuso na urgência”, o casal optou voluntariamente por este tipo de tratamento. Para o hospital é mais uma cama disponível. Para os Pires significa não haver restrições no horário das visitas da família.
Esta é uma das vantagens deste serviço que funciona 365 dias por ano e 24 horas por dia.
Para além desta participação ativa da família, Francisca Delerue, responsável pela UHD, salienta a diminuição da taxa de complicações relacionadas com o internamento hospitalar, bem como a reduzida taxa de mortalidade. Entre 2015 e 2016, a unidade registou apenas três óbitos (todos resultantes de doenças terminais), num total de 281 doentes admitidos, o correspondente a apenas 1 por cento.
O encaminhamento para a equipa da UHD pode ser feito no âmbito da consulta externa, do Hospital de Dia ou do serviço de urgência, sendo que este último corresponde a mais de 80 por cento dos casos.
Em qualquer uma das situações o diagnóstico, que é sempre feito no serviço hospitalar, tem de ser seguro, com a comprovação de que a patologia – que varia entre infeções urinárias e insuficiências cardíacas e respiratórias – pode ser devidamente tratada em casa.
Depois de uma primeira avaliação, é necessário perceber o contexto em que o doente se insere. Ainda que nem sempre seja exequível esta modalidade de internamento, quer seja por rejeição da possibilidade, ou pela inexistência de um cuidador, “a decisão final é sempre do doente” destaca o enfermeiro responsável Sérgio Sebastião.
Neste sentido e, de forma a proporcionar uma decisão consciente e informada, a UHD conta com um total de 19 profissionais: cinco médicos, nove enfermeiros, uma assistente social, uma farmacêutica, uma dietista, uma administradora hospitalar e uma assistente técnica.
A articulação entre os vários elementos permite perceber se estão reunidos todos os requisitos para se proceder ao internamento domiciliário nomeadamente, a existência de um cuidador, de condições de habitabilidade mínima e residência na área de influência do Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) Almada/ Seixal, cuja distância não exceda os 30 quilómetros (ou 30 minutos) do HGO. No caso de Maria são pouco mais de 10 quilómetros.
Depois de verificarem o peso e organizarem a toma da medicação pelas refeições diárias, a equipa está pronta para finalmente dar alta e fazer seguir o processo para os cuidados de saúde primários, cuja ligação é habitualmente efetuada pelo próprio hospital.
E é entre despedidas que seguimos viagem.
Um serviço com qualidade reconhecida
Vítor Pereira, 71 anos, é o próximo doente da lista. Completa o sétimo dia de internamento em casa e, tal como Maria, deverá ter alta. Em média, o internamento domiciliário não ultrapassa os 8,5 dias, o que se reflete numa diminuição em 30 por cento dos custos, em relação ao internamento hospitalar.
Mas a esses sete, Vítor tem de somar mais 12. Uma infeção causada por uma bactéria no sangue, contraída depois de realizar um exame de diagnóstico complementar no HGO, obrigou Vítor a ocupar uma cama do hospital. Só assim poderia receber tratamento intravenoso, com um fármaco apenas acessível para consumo hospitalar. “Entrei bem e saí de lá todo roto” relembra enquanto nos mostra o ginásio, onde pretende voltar assim que lhe deem permissão.
Quando teve conhecimento de que era possível continuar com o tratamento em casa, na companhia da família e com as visitas regulares da equipa da UHD, Vítor não hesitou em aceitar. Para além disso sabia que sempre que precisasse de se deslocar ao hospital para realizar exames no âmbito do internamento domiciliário, o transporte era assegurado pelo HGO, sem qualquer custo adicional. Uma espécie de “tratamento VIP” refere.
A satisfação dos utentes, e respetivos cuidadores, bem como os resultados deste serviço são comprovados não só pelos elogios que se refletem nas páginas imaculadas do livro de reclamações, mas também pela baixa taxa de retorno hospitalar (7,8 por cento).
Para a esposa o serviço “está mais do que recomendado, e até ajuda na recuperação”.
Mais do que um cuidado personalizado, a UHD presta um papel preponderante na educação para a saúde e na promoção da autonomia, quer do doente quer do cuidador, num ambiente familiar chamado casa.
Prémio Boas Práticas
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